terça-feira, 5 de maio de 2009

Sexta-feira

Eu ia embora, como quem nada queria.
Saí do bar porque a alegria exagerada daqueles rostos me incomodou demais.

- Sorri, Juliana. Ou vai embora.

Então eu fui. Numa quase rebelião.
Caminhando eu fui, como quem nada quer. Um sorriso por um cigarro.

- Chega aqui.

E eu fui.
De todos os patéticos inquisitores, de todas as bocas curiosas e de todos os rostos confusos, que naquele dia tentaram me compreender, só ele soube me abrir a alma.

- Tu vai pro...
- Vou! E tu?!
- Não vou.
- Por que?
- Tô sem grana.
- Bora! Vai ser legal.
- Tu paga pra mim?
- Se eu tivesse com grana, eu pagava.
- Eu também.

E sorrimos conformados, como duas crianças. Me destraí, com a espontaneidade do momento.

(Particularmente, as bocas das pessoas me hipnotizam - e confesso que deve ser estranho pra meus objetos humanóides de contemplação, ver-me fora da mente, olhando as suas bocas falarem.)

É que em certos raros momentos, e são bastante rápidos, as bocas se riem de uma maneira encantadora. Durante dois milésimos de segundo, a boca dá um sorriso que parece sair da alma.

Pedro me destraía. Percebi, ou apenas tive a impressão, que ele olhava a minha boca também. Às vezes sem cerimônia, às vezes como quem não olhou. Pronto. Pra mim, eram duas bocas que se olhavam. Duas bocas que se divertiam. Duas criaturas que se contemplavam. Sublime distração inesperada, que me fez sorrir a alma.


Com uma bermuda e esse sorriso apenas, e seus olhos apertados, que também parecem sorrir, eu sonho com ele e sua boca. Acordando e falando, num quarto de Olinda, num dia de sol...


- Juliana distante, achando que tem poesia onde não tem.

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